terça-feira, 11 de dezembro de 2012

A negra do museu

Semana passada parei para apreciar uma exposição de trabalhos de alunos da minha faculdade. Nunca havia visto quadros tão bem feitos por alunos de Arte. Passei por cada um deles vagarosamente, tentando ler o que eles diziam, buscando além do que foi pintado pelo artista. Ao chegar no fim da exposição, lá estava ela. Uma mulher negra, com um olhar pacífico e sábio, vestindo roupas coloridas que contrastavam com sua pele escura. Ela parecia estar viva dentro do quadro. Foi uma sensação incrível. Pensei em tirar uma foto com meu celular, mas hesitei. Precisava mais que uma foto, então decidi perguntar pelo preço da obra. Quem sabe poderia levá-la para casa.
"Não tá a venda não. Essa é a mãe do artista, ela é da Nigéria, então tem valor sentimental," disse um senhor de feição engraçada. Fiquei em silêncio, queria muito comprar aquele quadro. Ele então perguntou: "Por que você gosta desse quadro? O que fez você querer comprar?" Eu poderia dizer que era o uso de cores, ou a perfeição do retrato, ou o fato dela representar uma cultura totalmente diferente da minha. Mas a resposta que me veio na hora foi: "Ela está em paz...é só ver nos olhos dela."
O senhor se identificou como membro do departamento de arte, e disse que o artista do quadro tinha que me conhecer. Ele tinha que ouvir o que eu tinha para dizer, especialmente por estar me referindo à mãe dele. O senhor me perguntou se eu pintava também. "Não, apenas escrevo, quem dera pintar um quadro assim." Ele riu e comentou: "O aluno que pintou esse quadro é poeta também. Arte é arte, não é?...Bom, eu preciso ir, mas foi bom falar com você."
Eu agradeci e fui embora pensando na conversa que acabava de ter com um estranho, mas um estranho que me entendia. Ele entendia o que eu via no quadro, ele entendia a arte. Depois de almoçar, pensei que já que não poderia comprar o quadro, pelo menos tinha que guardar uma foto dele. Quando voltei o quadro não estava mais lá, era o último dia da exposição. A Nigeriana havia partido sem dizer adeus. O momento passou, o quadro se foi, e agora tudo o que resta para que me lembre dela é uma memória e uma conversa que tive em frente de seus olhos. Mas ainda havia algo a ser feito, ou melhor, escrito:


Passei por você e vi em seus olhos
a sabedoria colhida de uma vida
tão colorida quanto sua vestimenta.
E em seu rosto
uma feição que lamenta
e ao mesmo tempo sorri
e abraça a luz do sol
e não se engana com pouca coisa.
Sua pele cansada reflete o que não diz
sua expressão pacífica;
pacífica e sábia.
E linda.
Queria ter-lhe em casa
todos os dias a me olhar da parede.
E sem dizer nada
responder minhas dúvidas
e indagações de um dia sozinho.
E me fazer companhia
com toda sua sabedoria.


-Carla Medeiros
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